terça-feira, 30 de outubro de 2007

A logística do gol




Costumo utilizar com meus alunos um artigo originalmente publicado na revista Quatro Rodas denominado "O Circo Voador", que trata da complexa operação logística da Fórmula 1 para deslocar toda a sua estrutura de uma país a outro - muitas vezes intercontinentalmente - com grande eficiência.

O conteúdo é bastante pertinente e permite mostrar a logística de uma forma diferente da tradicional. Me lembrei dele agora que acabou de ser confirmada a indicação do Brasil como sede da Copa do Mundo de 2014, pois certamente este mega evento também terá a logística como um de seus elementos essenciais para que tudo transcorra da melhor forma possível (dizer que "argentino nenhum poderá botar defeito" foi uma gafe tremenda, Sr. presidente).

Provavelmente a Copa do Mundo será tema de outros comentários futuros aqui neste espaço, mas de imediato vou resumir alguns elementos que considero essenciais à logística da competição:

INFRA ESTRUTURA PORTUÁRIA
Será importante porque os altos custos e as limitações de carga do transporte aéreo poderão incentivar alguns dos países participantes a enviar por via marítima equipamentos de treinos, uniformes e outros. Neste caso pelo o menos dois ou três portos nacionais deveriam estar preparados para agilizar o fluxo e o desembaraço aduaneiro destes materiais, de forma que não comprometa o planejamento dos participantes que optarem por este tipo de transporte. Estes portos também deverão estar ligados à malha viária e aeroviária, tanto para o fluxo de pessoas como para o de produtos.

Além disso, um grande fluxo de cruzeiros marítimos deverá ter como destino o Brasil durante a Copa do Mundo, pois a maioria das cidades candidatas é litorânea ou está próxima de um porto. Um pier para os navios e um processo alfandegário rápido tornam-se importantes para agilizar o embarque/desembarque dos visitantes, que certamente estarão havidos por conhecer as belezas do Brasil e gastar (muito) em dólares, euros e yuans.

INFRA ESTRUTURA AERO PORTUÁRIA
Os aeroportos precisarão ser ampliados para comportar o grande volume de pessoas que irão utilizá-los no curto período de um mês. Serão necessários grandes centros de informações com suporte a diversas línguas estrangeiras, além de lojas de conveniências, restaurantes, aluguel de veículos, estacionamentos, táxis e interligação inteligente com o transporte urbano (trem, metrô ônibus).

A internacionalização do maior número possível de aeroportos também permitiria desafogar o tráfego aéreo no eixo Rio-São Paulo, facilitando tecnicamente a chegada das delegações, jornalistas, turistas, dirigentes e árbitros ao seu destino final, pois serão entre 10 a 12 sedes que provavelmente estarão geograficamente distantes neste país de dimensões continentais. Um grande número de escalas e conexões com certeza não agradaria nem um pouco estas pessoas.

Ainda lembro que dentro do próprio país as equipes costumam se deslocar para jogos em cidades diferentes de sua sede. As grandes distâncias que temos sugerem que isto deve, na maioria dos casos, inviabilizar qualquer outro tipo de transporte que não seja o aéreo, então construir uma rede de vôos sem escalas entre as cidades que abrigam jogos será ponto chave na organização do evento.

TRANSPORTE RODOVIÁRIO
As distâncias entre algumas sedes no Nordeste e Sudeste podem viabilizar o deslocamento rodoviário, não das equipes, provavelmente, mas de jornalistas e visitantes que estiverem no país. Um sistema de transporte coletivo organizado, com pessoal qualificado e linhas diretas pode contribuir para a sua utilização.

As rodovias necessitarão de melhorias estruturais (o processo de concessão recém concluído pode contribuir para que isto esteja pronto a tempo) e de pontos de apoio e informação aos viajantes que necessitarão de pessoas/sistemas aptos a se comunicar em diversas línguas diferentes.

Ainda será necessária ligação dos portos que receberem cruzeiros (ver item infra estrutura portuária) com cidades não litorâneas. São Paulo e Curitiba são bons exemplos desta necessidade.

Uma alternativa interessante, mas que creio infelizmente não será implementada, seria desenvolver uma ligação ferroviária interestadual através de trens rápidos.

Há um projeto para realizar isso entre as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, mas o ideal seria que a Copa do Mundo determinasse um horizonte mais amplo para este modal, fazendo, por exemplo uma ligação entre Curitiba-São Paulo-Rio de Janeiro-Belo Horizonte. Seria um legado precioso que a competição deixaria ao Brasil. Seria...

ORGANIZAÇÃO URBANA
Hotéis, restaurantes, estádios, hospitais, shoppings e pontos turísticos diversos terão grande movimento durante uma copa do mundo. Sistemas de transporte urbano que façam uma ligação rápida e direta entre estes pontos serão essenciais no decorrer da competição para não causar transtornos aos visitantes.

Identificar de forma clara estas rotas através de placas trilingües pode facilitar também o fluxo das pessoas aos seus destinos, diminuindo congestionamentos e a necessidade de serviços de apoio. Aliás, a identificação clara será necessária em todas as cidades envolvidas.

Segurança pública, rede hoteleira qualificada, centros de imprensa, infra estrutura de comunicações e estacionamentos são exemplos de outras preocupações que a Copa do Mundo trará ao Brasil. Em momento oportuno, continuo a discussão sobre estes tópicos.

Talvez meu parágrafo final pareça cético, mas dado o histórico brasileiro de promessas não cumpridas, por enquanto o importante é acreditar e fazer o que estiver ao nosso alcance para que pelo o menos algumas das melhorias estruturais necessárias sejam de fato executadas, pois elas são essenciais ao Brasil, mesmo que não tivéssemos a perspectiva de uma copa do mundo daqui a sete anos.

4 comentários:

Emerson disse...

Douglas, o circo da copa do mundo só usa aviões, então no quesito portos fica a necessidade, já velha e atrasada, de instalações decentes e equipes funcionais para desembaraçar turistas que chegam por via marítima.
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No item aeroportuário, nossos aerportos precisam ser adequados aos novos A 380, porque, certamente, teremos 4 ou 5 desses babies chegando quase ao mesmo tempo, desembarcando 4.000 passageiros. Com essa alfândega?
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Sem chance para o transporte rodoviário. Turista não terá tempo a perder e jornalistas nem pensar. Transporte aéreo em 2014, muito mais que hoje, será o meio comum de deslocamento, já que não temos e não teremos TGVs entre as principais cidades. Com sorte, só no trecho SP/Rio.
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No big deal, diria, tudo é ajeitável, mas depende de seriedade, competência e um padrão mínimo de honestidade.
Aqui o bicho pega, infelizmente.

Douglas Heinz disse...

Concordo com a necessidade de aprimorar os aeroportos para os A380, aliás, penso que isto deveria ser uma prioridade desde já.
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Mas considero que o transporte rodoviário, se bem planejado, poderia ser aproveitado em algumas situações, sobretudo porque voôs estão sujeitos a diversas variáveis que podem comprometer os horários, como as condições metereológicas para pousos e decolagens.
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O melhor mesmo seria um sistema ferroviário de passageiros no eixo Paraná-Sudeste, mas isso, como escrevi, me parece uma realidade distante.

Pédre Cóshta disse...

Douglas, valeu!
Eu, há 2 dias, quando o Douglas referiu o seu blog no JA e falou das questões da logística, eu vim aqui ler.

Não posso comentar, em concreto, pois não tenho conhecimentos profundos da realidade brasileira.

Por isso, falando em termos gerais, tudo o que escreveu, parece-me fazer lógica.
Haja é vontade, honestidade e planeamento para executar um projecto condizente com o superior interesse das populações.

abraces!

Chico da Kombi disse...

Caro Douglas,
A rica Fórmula 1 tem grana pra levar o Circo Voador até para lua.
GP da Lua 2035. Já pensou! :o)
Abraço.